Avá-Canoeiro de Goiás: um povo perseguido que sacrificou crianças para sobreviver

04 maio 2023 às 17h11

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Na madrugada de quinta-feira, 4, faleceu a indígena integrante da única família de cinco sobreviventes do povo indígena Avá-Canoeiro em Goiás. Nakwatcha Avá-Canoeiro tinha 78 anos, estima a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Ela foi vítima de câncer. Mas, por anos, Nakwatcha Avá-Canoeiro e seu pequeno grupo fugiu de caçadores e do massacre a qual seus antepassados sofreram por séculos.
A sobrevivência da pequena família foi marcada por tragédias. Eles conseguiram chegar a este século se escondendo em uma pequena caverna. A porta da gruta era tampada com muitas folhas para impedir que perseguidores encontrassem o local. O alimento consistia em poucas frutas e castanhas, que conseguiam coletar.
Com medo, Nakwatcha e seu povo se esconderam. Se calaram, numa resistência silenciosa. Chegaram ao ponto de evitar as crianças, pois elas com seus choros os “denunciariam” aos caçadores. Para isso, a sentença de seus bebês era a morte. Tiveram que derramar o próprio sangue, pois sabiam qual seria o destino de todos. Quando foram encontrados, Nakwatcha recordou aos pesquisadores como testemunhou as mortes dos seus parentes: um tiro na cabeça.
O indigenista Renato Sanchez lembra o quanto foi difícil para que este povo pudesse receber outras pessoas. O quanto foi difícil eles voltarem a acolher suas próprias crianças. Arredios pelo massacre do qual foram vítimas, “eles criaram resistência e medo”. “Hoje não, um bebê é uma alegria para eles, fazem festas e comemoram”, enfatiza. Em 21 de outubro de 2022, nasceu Numaeky, filho de Trumak Avá-Canoneiro e Tatiane Tapirapé. Com poucos membros, a etnia tem se miscigenado.

Uma carta escrita pelo presidente da província do Estado de Goiás, Antero Cícero de Assis, em 1874, endereçado ao promotor da Cidade de Goiás, narra conflitos entre Avá-Canoeiro e os colonizadores da região. A violência acontecia às margens do Rio Araguaia.
Duas famílias
Marlene Moura, no livro “Índios de Goiás”, edição 2006, ressalta que, antes da colonização da região central do Brasil, os Avá-Canoeiros se distribuíam em aldeias com população entre 250 a 300 habitantes. Atualmente, segundo registros, não passam de duas famílias. Uma com apenas cinco membros, agora, quatro com a morte de Nakwatcha. A outra, localizada no Tocantins, com apenas oito membros.
Ao Jornal Opção, a professora Dulce Pedroso, autora da obra “O Povo Invisível — A História dos Avá-Canoeiros nos Séculos XVIII e XIX”, destaca que os dois grupos eram um só. É que eles dominam toda a região do Rio Tocantins e Araguaia. “Eles são parentes e recentemente voltaram a ter contatos”, relata.
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