Sonhar não custa nada: em 10 anos, uma Goiânia centenária 100% sustentável

24 outubro 2023 às 11h59

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Nos períodos de crise, o que sustenta o ânimo e afasta do ser humano a desolação é a capacidade de olhar adiante e desenvolver, a partir daí, uma perspectiva. Selecionando entre ditos e provérbios, seria o mesmo que dizer, a si mesmo, “depois da tempestade, vem a bonança”.
Nesta terça-feira, 24, Goiânia chega a 90 anos com pouco a celebrar pelo presente, ao contrário de outras datas redondas anteriores. Há exatas três décadas, por exemplo, a capital se tornava uma ajeitada sessentona vivendo a era Darci Accorsi, que recebera as chaves da Prefeitura de outro professor, Nion Albernaz, para quem, anos depois, ele as devolveria.
Eram os tempos da Goiânia “capital das flores” e “cidade ecologicamente correta”, por conta, especialmente, do modo de cuidar característico dos dois gestores. Noves fora o natural marketing político e a despeito da crônica desigualdade social elevada – que, aliás só se agravou neste século –, foram certamente épocas muito mais agradáveis para a população em termos de qualidade de vida.
Agora temos um lugar nonagenário. O tempo passa mesmo muito rápido e uma atitude recomendada a quem ama de fato Goiânia é, neste 24 de Outubro, avaliar o presente para preparar o futuro que, irônica e necessariamente, precisa reconstruir o passado.
A nova capital nem tinha nome definido quando o então interventor Pedro Ludovico determinou suas coordenadas. E é preciso pela enésima vez ressaltar que ele e sua equipe fecharam questão exatamente sobre esse ponto de Goiás por causa da abundância de água – o que está, diga-se, em das versões para a escolha do nome – “guyanna”, palavra tupi-guarani, quer dizer “terra de muitas águas”.
Tem base, como se diz “no” Goiás (entre aspas, porque a conjunção é um neologismo que está na moda, mas além de errado, não soa bem, mas aqui vale pelo meme). Afinal, é aqui o encontro do Rio Meia Ponte com dois ribeirões outrora bastante caudalosos, o João Leite e o Anicuns. Os mananciais acolhiam à época, as águas de 150 outros leitos, de todos os tamanhos.
É isto: por muito pouco, a área de Goiânia não seria um lindo e completo brejo, dadas as tantas veredas. Não que boa parte dela não tenha tido, lá atrás, esse aspecto: o que se chama de progresso literalmente passou por cima da região do subterrâneo Córrego dos Buritis, no Setor Sul até o bosque de mesmo nome) e a do Setor Goiânia 2, para citar aqui apenas dois exemplos de terrenos alagadiços.
Como desafio para os próximos dez anos, lança-se aqui uma proposta para ser entregue no centenário: recuperar a riqueza hídrica da capital. Mais do que uma firula urbanística, é algo vital, no sentido estrito do termo, para os goianienses: é medida urgente para sobreviver em meio às mudanças climáticas, ou se repensa o modo com que lidamos com o ambiente urbano ou a secura do ar, a estiagem e o calor que hoje às vezes parecem ser insuportáveis serão iminentemente mortais.
É um projeto audacioso e, por enquanto, nada mais que utópico. É que, a despeito da situação crítica, o poder público faz vistas grossas e adia o enfrentamento. Ao contrário: as mudanças nas leis da cidade revelam que a administração municipal, a Câmara de Goiânia e o poder público em geral fazem pouco caso da situação. Vereadores, aqueles que deveriam cuidar e fiscalizar da melhor forma a cidade que representam, são os primeiros a entregar de bandeja o futuro seja por ação – com favorecimento explícito a setores interessados apenas em fazer dinheiro e “dane-se o resto” –, seja por inépcia – com a falta de cobrança por melhorias que devolvam a sustentabilidade à capital.
A esperança está, como disse em um artigo publicado dias atrás o analista ambiental Gabriel Tenaglia Carneiro, doutor em Ciências Ambientais pela Universidade Federal de Goiás (UFG), em Goiânia parecer ter “a rebeldia em se manter sustentável”.
Sonhar não custa nada. Temos dez anos pela frente para concretizar a missão de devolver as águas e o verde que tiraram da terra escolhida por Pedro. Que o atual prefeito e os futuros, bem como legisladores, autoridades, empresários, estudiosos, líderes comunitários e a população goianiense em geral, encampem essa tarefa, com desprendimento e propósito.