Edson Leite Júnior, Elder Dias, Euler de França Belém e Giovanna Campos

A conversa com o senador Vanderlan Cardoso (PSD) na sede do Jornal Opção se inicia pontualmente – na verdade, o entrevistado havia chegado até mesmo com alguns minutos de antecedência. Político tarimbado, ele anota o nome de cada jornalista e responde com tranquilidade às questões, mesmo as mais polêmicas. E deixa bem claro que “ainda” não definiu sua posição em relação a se candidatar novamente à Prefeitura de Goiânia.

Nas duas últimas eleições municipais, o empresário e parlamentar que ganhou notoriedade ao fazer uma gestão altamente aprovada em Senador Canedo perdeu para dois gigantes do MDB e da política goiana: Iris Rezende, em 2016, e Maguito Vilela, em 2020. Em ambas as corridas eleitorais, Vanderlan manteve basicamente o mesmo projeto. E, caso concorra ao cargo no próximo ano, já avisa. Ainda que aprimore alguma coisa na proposta, não vai mudar substancialmente nada. “As demandas continuam as mesmas: a questão da Feira Hippie, a revitalização do Centro, o transporte público, tudo aquilo que não foi resolvido”, diz.

Em suma, o que pensa o senador e (mesmo que ainda não se assuma como tal) pré-candidato que lidera quase todas as pesquisas de intenção de voto, publicadas ou internas? “Goiânia precisa de parque tecnológico, de polo de desenvolvimento e o município não vai funcionar se não tiver subdivisão em regionais”, responde. Nesta entrevista, o presidente estadual do PSD fala também sobre seu mandato, reforma tributária e o comando da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, onde já presidiu também a Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática.

Giovanna Campos – Em um artigo que o sr. escreveu recentemente sobre Goiânia, disse que a cidade hoje sofre com a falta de planejamento. Sendo gestor da capital, qual é o ponto mais crítico e qual seria sua primeira ação?

Goiânia não precisa de uma “primeira ação”, precisa é de um planejamento. A cidade está sem rumo. O reflexo disso está na participação da cidade no bolo de recursos oriundos de impostos – no caso, do ICMS. Ainda em 2016, eu apresentei o seguinte dado: Goiânia, que no passado havia chegado a ter quase 30% de participação na arrecadação do Estado, naquele ano já tinha apenas 16%. À época, eu declarei – em entrevistas, em debates, no horário eleitoral etc. – que, se Goiânia não voltasse a conceder incentivos e a atrair empresas e ter polos de desenvolvimento, algumas ações macro seriam prejudicadas ao ponto de em dez anos a arrecadação cair mais ainda, para algo em torno de 10% a 12% nessa mesma participação no bolo total do Estado. Agora há pouco foi anunciado o índice mais recente, e o que temos? A arrecadação já caiu para 13%. Veja bem, já caiu de 30% para 13%.

Repórteres do Jornal Opção recebem senador Vanderlan para entrevista na redação | Foto: Leoiran / Jornal Opção

Goiânia precisa de um planejamento por inteiro

Se formos fazer a conta do que perdemos, estamos falando uma conta de mais de R$ 1 bilhão por ano. E os debates continuam os mesmos: em 2016 e em 2020, falava-se de Feira Hippie, de revitalização do Centro, de transporte coletivo. Quando nossa candidatura apresentou a proposta dos polos de desenvolvimento todos copiaram, inclusive Iris [Rezende], em 2016, e Maguito [Vilela], em 2020. Falaram das divisões administrativas regionais e dos polos de desenvolvimento, tudo que eram ideias nossas, mas não colocaram nada em prática.

Então, Goiânia não é questão de uma ação, mas de um planejamento por inteiro, com todo tipo de demanda, inclusive de curtíssimo prazo. Quais seriam essas? Ora, como vamos fazer qualquer debate antes de fazer coleta de lixo como se deve, antes de ter uma cidade limpa, iluminada, segura? Isso é a coisa mais primária. Isso é obrigação.

No momento atual, seria preciso uma união de forças, deixando a questão partidária de lado. Nem estou dizendo que eu seja o melhor nome, mas é preciso procurar quem tenha o melhor perfil para tirar Goiânia desse buraco em que entrou, porque essa demanda vai levar alguns anos e decisões amargas terão de ser tomadas. Quem terá coragem de tomar essas decisões? Por exemplo, em relação à Comurg é preciso tomar medidas drásticas, tem de profissionalizar e pôr outro plano em ação. Alguns dizem que tem de privatizar [a Comurg]. Mas, se é a forma de gerir que está errada, são os funcionários os culpados? O administrador de Goiânia não pode terceirizar a caneta para ninguém. Precisa ter pulso, sua palavra tem de valer. Pode ser qualquer pessoa, mas precisa ser dessa forma. Goiânia hoje não tem gestão, o prefeito a terceirizou.

Euler de França Belém – O que exatamente ele terceirizou? E para quem?

Terceirizou tudo na administração. A Comurg está terceirizada. A saúde do município, da mesma forma – agora que trouxe um profissional para a área, mas em cima da hora. Veja o déficit da Saúde. Se tomarmos todas as dívidas, veja se não vai passar de R$ 200 milhões. Pode ser um supersecretário, mas terá condições de gerir, o prefeito vai ter peito para chegar aos vereadores e dizer “agora aqui tem gestão!”. Vai ter? Saúde é uma área técnica, é preciso o prefeito ter nomes competentes e de sua confiança para comandar cada unidade, cada região. É preciso que as receitas e as ações sejam definidas de fato. Da mesma forma, em todas as áreas. Mas o que temos é, vira e mexe, problema com a Câmara, desentendimento com a base etc. E o responsável por isso é o próprio prefeito, que cedeu logo no início, porque estava vulnerável. Sua posse foi irregular, todos sabem disso.

Euler de França Belém – Irregular em que sentido?

Basta dizer que deram posse a Maguito [que estava internado em estado grave e morreria no dia 13 de janeiro de 2021]. Era para ter tido nova eleição.

Euler de França Belém – Houve ação judicial, por que isso não deu em nada?

Na verdade, houve perda de prazo. Muitas pessoas chegaram até mim instigando a entrar com uma ação. Eu decidi que não iria entrar por esse lado. Por quê? Porque no voto eles ganharam, ainda que com diferença pequena, o eleitor quis assim. Não vou discutir algo que o eleitor decidiu, quando todos foram às urnas já sabia daquela condição [da doença grave de Maguito].

O PSD não é refém de meu nome para as eleições municipais

Euler de França Belém – Pelo que disse há pouco, o sr. sugeriu que pode não disputar a Prefeitura de Goiânia e, em vez disso, apoiar alguém?

Claro, o PSD não é refém de meu nome. O partido tem seus nomes e estou trabalhando para trazer outros mais. Nós temos Francisco Júnior [ex-deputado federal e hoje na presidência da Companhia de Desenvolvimento Econômico de Goiás (Codego)], Simeyzon Silveira [ex-deputado estadual e presidente do PSD municipal], Cairo Salim [deputado estadual] e Vilmar Rocha [ex-deputado federal e presidente do PSD estadual antes de Vanderlan].

Euler de França Belém – O sr. poderia apoiar um nome de outro partido?

Desde que tenha projeto para Goiânia. Todos os que estão pensando na cidade e têm condições de dizer “nós vamos fazer”.

Euler de França Belém – O sr. apoiaria um nome como Jânio Darrot [ex-prefeito de Trindade]?

Tranquilamente. Jânio Darrot é um administrador, pessoa séria, não é bandido. Eu o conheço há muito tempo, é meu amigo.

Euler de França Belém – Ele seria um nome adequado para Goiânia?

Por que não? Se um cidadão administra uma cidade como Trindade, com sérios problemas – como, no meu caso, Senador Canedo, ou Aparecida de Goiânia, no caso de Maguito Vilela –, e faz o que fez está apto a governar nossa capital. E digo mais: um prefeito de uma cidade pequena que se torna um diferencial está apto a gerir Goiânia, desde que tenha pulso e entenda de administração.

Euler de França Belém – E o perfil de Jânio é muito parecido ao seu. Os dois venceram na iniciativa privada antes de se tornarem políticos.

Sim, há muitas semelhanças. Você já ouviu falar de algum escândalo envolvendo Jânio Darrot? Não tem. Eu conheci um homem chamado Silvan Furtado [morto em 2014], que administrou Jesúpolis [município que faz divisa com Jaraguá e fica a 110 quilômetros de Goiânia] e ganhou o prêmio Prefeito Empreendedor duas vezes seguidas. A cidade [Silvan a administrou de 2005 a 2012] tinha o segundo menor PIB do Estado. Ele foi o maior construtor de casas do País, em números proporcionais, implantou um distrito industrial no município, fez uma gestão impecável nas áreas de saúde e educação. Esse sujeito estaria apto a ser governador do Estado ou a qualquer outro cargo. Quem pega o segundo menor PIB e faz a transformação que ele conseguiu, imagine o que faria em um município que tem grandes recursos, com a capacidade política que tinha?

Então, para mim, não adianta falar “eu sou de Goiânia, eu nasci aqui”. Eu não nasci aqui, nasci em Iporá [município do Oeste goiano, a 216 quilômetros da capital] e vim aqui aos 14 anos na carroceria da caminhonete de meu pai. Para ser um bom gestor não é preciso ter nascido na cidade. Eu não nasci em Senador Canedo e, quando concorri à prefeitura lá, fui muito criticado por ser cidadão “de fora”. Ora, Jânio Darrot não nasceu em Trindade, Maguito não era de Aparecida.

Elder Dias – O sr. citou ex-prefeitos e não citou Gustavo Mendanha, ex-prefeito de Aparecida, sucessor de Maguito. O que o sr. pensa dele?

É outro excelente nome. Se Gustavo Mendanha conseguisse viabilizar sua candidatura em Goiânia, possivelmente eu o apoiaria, sem dificuldade. Estou me dando muito bem no PSD porque é um partido de centro, sem restrição a ninguém. Eu dialogo com todo mundo. Governei Senador Canedo e tive ajuda do governo federal quando o PT era governo, eles [do PT] faziam parte da administração. Hoje, o PSD tem três ministérios em Brasília e Kassab [Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD] foi praticamente quem conduziu a candidatura de Tarcísio [de Freitas, governador de São Paulo]. Vejo alguns partidos falando que têm restrição a esse nome ou àquele partido. Nós, não. Nós vemos os projetos, as pessoas. Não temos restrição a nenhum nome.

Sobre Goiânia, precisamos deixar a vaidade de lado e pensar em quem pode unir todo mundo e tenha condições de administrar a cidade. A recuperação não será fácil, ainda mais com as dívidas grandes que foram contraídas.

Elder Dias – O sr. atribui essas dívidas à atual administração ou já existiam e complicaram a vida do prefeito?

Euler de França Belém – Em outras palavras, o sr. não acha que o prefeito talvez tenha recebido uma “bomba” para sua gestão?

Se isso aconteceu, então ele omitiu informações, porque o prefeito foi à imprensa para falar que tinha R$ 1 bilhão e tanto em caixa? Então esse caixa, de uma hora para outra, sumiu? Na pré-campanha de 2020, dei entrevista sobre o empréstimo que Iris [Rezende, então prefeito de Goiânia] estava contratando, de R$ 1 bilhão e com juros de mercado. Encomendei um estudo técnico para saber quanto seria de juros por mês e a diferença daquilo em relação ao que seria um financiamento pelo BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] e pelo Bird [Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento], que emprestam dinheiro para as prefeituras. Agora mesmo, está passando pela comissão que presido [Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado] um empréstimo de cerca de R$ 600 milhões para Aparecida de Goiânia.

Então, naquela pré-campanha em Goiânia só fiz o comparativo do que seria o impacto, em longo prazo, do dinheiro que a administração estava pegando naquele momento, via Caixa Econômica Federal. A diferença de juros, por ano, deu R$ 110 milhões. Por que Goiânia estava fazendo aquilo? Primeiramente, sou totalmente contra endividamento. Temos aqui 30 anos para pagar com o Bird ou com o banco do Brics [bloco econômico formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul], que é presidido pela ex-presidente Dilma Rousseff, com uma taxa de juros de 3,5% ao ano em dólar. Ainda que fiquemos à mercê do dólar, temos um financiamento esticado e com prestação pequena. Isso dá tempo de o investimento que está sendo feito trazer retorno. Não se pode fazer financiamento para pagar só dívidas. Goiânia até então não tinha dívidas, podem conferir o histórico.

Veio então o empréstimo, que foi muito fácil e a gestão entrou de cabeça nele. Se observar o orçamento de Goiânia para o próximo ano, veja o quanto tem de pagamento de juros e de [parcela] principal. A partir disso, veja então a situação em que o município está entrando, como muitos outros. A Caixa saiu oferecendo dinheiro com facilidades, porque os bancos têm em excesso para oferecer. Ora, esses juros estão dando de 20% a 22% ao ano. Portanto, se há um empréstimo de R$ 1 bilhão, são R$ 200 milhões anuais só de juros, ou cerca de R$ 16,6 milhões por mês, fora o principal. Então, em um ano eleitoral, toma-se um empréstimo desses, faz-se um investimento em obras sem qualidade, como foi feito em Goiânia, e a dívida fica para o outro pagar.

Foto: Leoiran / Jornal Opção

Quem pôde ‘espirrou’ de Goiânia e abriu empresa nos municípios vizinhos

Elder Dias – E o que poderia ser feito em relação a isso?

Goiânia não tem planejamento de arrecadação, não tem polo de desenvolvimento e sumiu todo mundo daqui – basta ver o quanto as cidades do Entorno da capital cresceram. Vejam o quanto Goiânia era grande em fabricação de móveis. Quando assumi Senador Canedo, as pessoas começaram a me procurar e eu implantei o polo moveleiro. Somente uma empresa de lá tem 600 funcionários. Da mesma forma, Aparecida também cresceu, entrou na concorrência com Goiânia por conta do ISSQN. Quem pôde “espirrou” de Goiânia e abriu empresa nos municípios vizinhos, já que na capital a alíquota é de 5% e neles a maioria é de 2%. Ou seja, Goiânia está perdendo com ICMS, com ISSQN e aumentando despesas. Eis que aparece a dívida de um empréstimo violento assim. A conta não vai bater, não vai fechar.

Euler de França Belém – Alguns economistas recomendam que Goiânia não tenha distrito industrial; já outros, falam exatamente o contrário, criticam que a cidade não possua uma estrutura assim. Há também os que pensam que a cidade deveria ter outros empreendimentos, como na área de tecnologia e outros que tem baixo impacto poluente. Como o sr. avalia esse tema dentro de um projeto para o município?

Quando se fala em polo de desenvolvimento, erroneamente muitos já pensam em imensos distritos industriais. Não é esse o planejamento que fizemos para Goiânia. Nós queremos pegar a vocação de cada região, tudo isso mapeado por estudos. Por exemplo, na região noroeste, podemos pegar 20 mil metros de área pública para montar um polo calçadista. Imagine quantas empresas de calçados estão em fundo de quintal, precisando crescer. Da mesma forma, podemos juntar artesanato, confecção, serralheria, marcenaria etc. É isto, portanto: firmar as pessoas no local, na região, dando-lhes a oportunidade de prosperar. Assim, resolvemos em boa parte, por exemplo, o problema do transporte coletivo.

Como presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia do Senado, tive a oportunidade de ir a Campinas (SP), cidade que é referência em parque tecnológico. Lá de Campinas, depois, fizemos dois programas eleitorais. Planejamos, a partir daí, o parque tecnológico de Goiânia, na região do Campus Samambaia da UFG [Universidade Federal de Goiás], saindo do Residencial Orlando de Morais e emendando com a região noroeste. Todo esse projeto preservando os vários mananciais dessa área toda, tudo definido com base no que vimos em Campinas. O que vemos é que Goiânia sempre teve uma arrecadação superior à da cidade paulista. Hoje, se tomarmos a questão financeira, veremos como tudo mudou.

Euler de França Belém – Campinas superou a arrecadação de Goiânia?

Em muito (enfático). Isso se deve ao que investiram nesse parque tecnológico, a partir da iniciativa de um prefeito, Jonas Donizette, do PSB, partido a que eu era filiado à época. Campinas era uma cidade que vivia trocando de prefeito, com ações judiciais, um entra e sai o tempo todo. Esse prefeito, então, entrou lá e moralizou a situação, planejou a cidade.

Elder Dias – Quando o sr. visitou Campinas para observar essas mudanças?

Em 2020, levei nossa equipe de filmagem e fizemos dois programas de TV baseados em Campinas para apresentar a ideia do parque tecnológico de Goiânia. A área de tecnologia eu conheço, fui presidente da comissão no Senado. Estou ajudando a ampliar o parque tecnológico da UFG, no Campus Samambaia. Precisamos disso para atrair dinheiro, por meio de investimentos, e, com isso, empregos. Nós temos um déficit no País, só na área de TI, de 600 mil vagas. Mas não tem gente para as vagas que existem, os quadros são praticamente disputados a tapas. E temos tido a concorrência dos outros países. Estou alertando sempre para isso em meus pronunciamentos: estamos perdendo nossos cientistas. Da Embrapa, já foram quase todos [os pesquisadores] embora do País. Antes, perdíamos esse pessoal para os Estados Unidos e para a Europa. Agora, eles estão indo para o Chile, para o Peru. Nossos cérebros estão indo embora.

Euler de França Belém – O que o sr. vê de errado na proposta do prefeito Rogério Cruz para a revitalização do Centro?

Não conheço a proposta. Pode ser até mesmo a proposta que foi a nossa. Porque tudo que fizemos… olha, quando disputei a Prefeitura com Iris em 2016, uma pessoa que estava na campanha dele me confidenciou que achavam nossas propostas tão boas que só esperavam que a gente as lançasse. No outro dia já copiavam, só mudando o nome. A proposta que tínhamos para o Centro de Goiânia não era nada de faraônico, era de fácil execução: revitalização da parte cultural, da parte estrutural, a gastronomia etc., dar incentivo em IPTU por dez anos para as pessoas investirem nos imóveis, pintar as fachadas. Era espetacular e é a mesma coisa que vamos apresentar novamente, não tem nem por que mudar muito. Repito, não conheço a proposta do prefeito, pode até ser similar.

Se não firmarmos as pessoas em suas regiões, não terá transporte coletivo que se arrume

Euler de França Belém – O transporte coletivo é outro problema sério, no Centro e em toda a cidade. Mas o que a gente vê para o setor fica só em discurso de campanha, depois volta à estaca zero. O sr. tem mesmo um projeto para o transporte?

Eu volto a firmar: em 2016 e 2020 houve a discussão e apresentei a mesma proposta. Na próxima eleição eu vou apresentar a mesma solução, não vai mudar nada. Claro que faz parte falar de BRT, terminais, ônibus etc. Mas se não firmarmos as pessoas em suas regiões não terá transporte coletivo que se arrume. E então eu tenho de bater de novo na mesma tecla, a dos polos de desenvolvimento (enfático). É preciso fortalecer os comércios das diversas regiões. Vou dar um exemplo a partir desta camisa (aponta para a marca na camiseta de um repórter): eu descobri essa empresa quando fui entregar uns equipamentos ao [prefeito] Itamar Leão (PSDB), em Sanclerlândia. Falei a ele que queria visitar uma confecção da cidade e me levaram para conhecer uma facção que fabrica para a Sallo, que é quem tem essa marca da camisa. Quando vi a qualidade do produto, peguei o endereço da confecção e vim aqui no polo empresarial de Aparecida de Goiânia na sede da empresa. Não sabia que aqui tínhamos uma empresa desse porte. E agora tenho umas 20 peças deles, camisas polo e outras. Da Sallo, aqui de Aparecida. Agora imagina quantas pessoas essa empresa não firmou aqui no município vizinho: são 600 funcionários.

É preciso relembrar que as pessoas saíam de Aparecida e de Senador Canedo para vir trabalhar em Goiânia. Esses municípios, com seus polos, passaram a ter vida própria, não são mais cidades-dormitórios. Hoje, os ônibus que vinham abarrotados de lá para Goiânia buscam gente no Nordeste para essas empresas.

Euler de França Belém – Hoje há é muita gente de Goiânia trabalhando nessas cidades.

Exatamente. O que fizeram foi firmar sua população em seu local. É o que também precisamos para Goiânia, tudo planejado já, com estudos. Encaminhando esse conjunto – porque não é apenas o polo de desenvolvimento, precisa fortalecer o comércio, a parte cultural, dar opções para as pessoas em sua região – a gente muda a cidade.

Elder Dias – Vou fazer uma pergunta que hoje, em tempos de negacionismo, passou a ser necessária: o sr. acredita nas mudanças climáticas e no aquecimento global?

Sim, claro que acredito.

Foto: Leoiran / Jornal Opção

Precisamos reflorestar as margens dos córregos da capital

Elder Dias – A partir desse dado, que é a mudança do clima no planeta e seus efeitos, temos tido, uma seca fora do comum na Amazônia e chuvas intensas no Sul do País, acima da média deste período. Goiânia, por sua posição geográfica, em tese não sofreria riscos com eventos extremos como ciclones, por exemplo. Mas por aqui podemos sofrer com efeitos sobre as safras, as chuvas e a temperatura, entre outros. Como prefeito, como o sr. pensaria em preparar a cidade para enfrentar as consequências dessas mudanças climáticas?

Quando falamos da questão ambiental, a preservação da grande quantidade de mananciais que temos no município já ajudaria muito. Precisamos reflorestar as margens dos córregos da capital, que, por falta de orientação, foram desmatadas e ocupadas de forma muito próxima dos cursos d’água. O trabalho de preservação e de revitalização já contribuirá bastante, elevando para pelo 150 metros a distância para cada margem. Principalmente, se fizermos isso desde a entrada do Meia Ponte em Goiânia até ele deixar as divisas da capital e também junto com isso um trabalho com os municípios vizinhos. Preparar a cidade [para as mudanças climáticas] passa por aí.

Preciso dizer que gosto muito de estudar essas questões. Por exemplo, quando se fala na seca do Rio Amazonas, a maior que já houve foi há 83 anos, pior do que esta agora. Naquela época, não era a questão ambiental, como é hoje. Se formos pegar todos os históricos, de secas e de enchentes, vamos observar a mesma coisa.

A questão é que, nessas décadas todas, não houve muita conscientização. Eu venho de uma região de produtores, meu avô era um pequeno proprietário de terra. Na época, era bonito desmatar até quase dentro do córrego. Hoje, o pensamento dos próprios produtores tem mudado muito. Vindo recentemente de Jaupaci [município do Oeste goiano, a 215 quilômetros de Goiânia] de helicóptero com minha esposa, pude observar pontos em que havia erosão já com medidas de correção para contê-la, juntamente a um trabalho de reflorestamento. É algo que não acontecia 30 anos atrás.

Euler de França Belém – Mas isso não é algo para inglês ver? No Sudoeste goiano, percorrem-se centenas de quilômetros somente com paisagem de lavouras. Tudo está desmatado, apenas uma faixa pequena de reserva, quase que por obrigação.

Eu vejo que está tendo um trabalho de conscientização, a população está recuperando nascentes.

Euler de França Belém – A construção civil em Goiânia está aterrando nascentes para erguer arranha-céus. O Parque Flamboyant é um exemplo…

O Parque Flamboyant foi um projeto bem feito. Ali tinha um brejo, onde foi feito um ou dois lagos e permaneceu a mata. Tanto que a água não diminuiu.

Elder Dias – Na verdade, o lençol freático ali foi afetado pelas construções e, sim, foram reduzidas em muito as águas do Córrego Sumidouro, que abastecem aqueles lagos. Ou seja, o Sumidouro quase “sumiu”… A escolha do nome “Goiânia”, segundo uma versão bem aceita, vem de uma palavra em tupi-guarani que significa algo como “lugar de muitas águas”. Mas o que a gente vê hoje é uma necessidade cada vez maior de captar em novos mananciais para abastecer a população. Depois do Meia Ponte e do Ribeirão João Leite, o próximo projeto é o de buscar água no Rio Caldas para fornecer água para as próximas gerações. No aniversário de Goiânia, escrevi sobre o que pode ser feito em dez anos para “presentear” a cidade em seu centenário. O que vamos ter quando chegarmos lá, uma cidade mais verde ou cada vez mais dilapidada pelos interesses imobiliários, que inexoravelmente prejudicam os planos diretores?

A especulação imobiliária sempre vai existir e vai pressionar. O que faz a diferença é o gestor e o planejamento que for elaborado para a cidade. Em 2005, eu projetei Senador Canedo para até 2035, para não ficar na dependência de mudança de planos diretores. Amarramos esse planejamento por meio da união das três regiões do município, da preservação dos mananciais, a distância entre as construções. De fato, já houve outras administrações e estão fazendo mudanças no Plano Diretor de lá.

Tudo depende muito de quem está com a caneta na mão. O prefeito vai ceder à pressão imobiliária? Se são hoje 100 metros de margem até o manancial, o mercado vai querer que seja 30 metros. Contam cada lote que vão perder. É preciso que o gestor contraponha, diga que vão ganhar muito mais, de outra forma, se tiver ali uma área verde. O primeiro Plano Diretor de Senador Canedo eu fiz praticamente escondido, por conta da especulação imobiliária – até mesmo em relação as áreas que não estavam no projeto de expansão, para não ter achaque em cima dos proprietários, alguém que poderia pedir algum “recurso” [para aprovar]. É um sonho achar que não vai haver especulação imobiliária. Se puderem lotear dentro do córrego, vão lotear. O importante é a população ter consciência sobre os políticos que está colocando para cuidar da cidade. Em Senador Canedo, eu trabalhei nesse sentido e tive a parceria e o respaldo do Ministério Público.

Edson Leite Júnior – O que o sr. pensa em termos de saneamento básico?

Eu tenho um pouco de experiência com saneamento, tive de aprender na marra. Senador Canedo, quando eu assumi, não tinha nem começado a pensar na questão do esgoto. Hoje, tem 60% de linhas de esgoto prontas e o que falta é sua interligação. As últimas administrações, infelizmente, paralisaram esse projeto. Eu defendo que os municípios tenham autonomia com relação a água e esgoto, até como fonte de renda. Veja o potencial de Goiânia, com uma companhia como a Saneago. A gestão entregou a renovação [da concessão] praticamente de graça. Goiânia teria de ficar com pelo menos 10% de tudo que fosse arrecadado aqui. Isso tinha de ser do município.

Giovanna Campos – O sr. preside a Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Dentro dessa área, como está o projeto da reforma tributária?

 Nosso Estado perde muito com essa reforma tributária, assim como todos os do Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Estamos em fase de discussão, apresentamos algumas emendas que foram acatadas, o que melhorou alguma coisa, mas ainda está muito longe do ideal. No calendário, a votação do relatório do senador Eduardo Braga (MDB-AM) está pautada para 14 de novembro. Até lá, quero negociar alguns pontos. Se não chegarmos a um acordo, tenho certeza de que o texto não vai para votação. Se não houver mudanças, não vejo senadores e senadoras dispostos com ânimo para isso.

Giovanna Campos – Como o Estado será impactado com o atual texto da reforma, caso seja aprovado?

Há vários pontos negativos. O primeiro é o dos incentivos fiscais. Goiás se desenvolveu por meio dos incentivos, como a maioria dos demais Estados em desenvolvimento. Precisamos de mais tempo para sair da dependência deles. Outro ponto é o recolhimento do imposto, que está previsto para a ponta, no consumidor. Os Estados com menos consumidores, como o nosso, vão perder bastante, principalmente se comparados a São Paulo e Minas Gerais, por exemplo. Estamos discutindo se parte do imposto será cobrado na origem, pelo menos. Acredito que vamos ter acordo, mas, caso isso não ocorra, eu serei um dos primeiros a dizer que não votarei por uma reforma tributária que prejudique meu Estado.

Edson Leite Júnior – Estamos a menos de um ano das eleições municipais. O sr. já disse que o PSD não tem restrição a nenhum partido. Mas considera que há alguma resistência dos outros partidos ao PSD ou, mais especificamente, a seu nome?

Não vejo isso. Vamos pegar o caso de Goiânia. No primeiro turno, os grandes partidos certamente terão seus candidatos. Seria muita infantilidade de minha parte achar que o PL, com o tamanho que está e com o tempo de propaganda eleitoral na TV que tem, virá me apoiar logo de começo. Agora, caso a eleição vá para o segundo turno, é outra a negociação. Em Goiânia, o União Brasil, junto com o MDB, deve ter seu candidato; o PT já decidiu seu nome [a deputada federal Adriana Accorsi]. O PSDB está lutando para ter candidato no maior número possível de municípios. Portanto, repito: os grandes partidos terão seus candidatos. Os nomes mais fortes estão sendo disputados a tapa, a concorrência está difícil no Estado inteiro.

No caso do PSD, há uma questão nacional envolvendo um apoio, em relação a alguns partidos. Não faço parte da CPMI [do 8 de Janeiro], nem lá fui, nenhuma vez. Mas é uma decisão do partido, é preciso respeitar. Da mesma forma, a posição de cada um lançar sua candidatura. Sou tranquilo com isso. Se eu decidir ser candidato, minha candidatura nunca foi e nunca será do “se”. Tem gente que depende de “se o governador apoiar”, “se o fulano apoiar”, “se” isso, “se” aquilo. Quando vou para um projeto, já estou definido, se tiver apoio desse ou daquele, melhor.

Em 2014, eu estava em um projeto para o governo do Estado, juntamente com Jorcelino Braga [hoje presidente do Patriota] e Ronaldo Caiado. Por conta da candidata Marina [Silva, que vetou aliança com o DEM, partido de Caiado, quando era então pré-candidata à vice-presidência na chapa de Eduardo Campos (PSB)], o governador naquele momento saiu e fechou com Iris Rezende (MDB) para ser candidato ao Senador. Ficamos, então, só Braga e eu. O que fazer, então? Ser candidato. E fui candidato ao governo.

Estamos aperfeiçoando o que já tínhamos, até porque as demandas [para Goiânia] são as mesmas

Elder Dias – O sr. tem uma data limite para sua definição em relação a ser candidato novamente a prefeito de Goiânia?

Tem de ser até o começo do próximo ano. Mas não parei em momento nenhum. Estamos aperfeiçoando o que já tínhamos, até porque as demandas são as mesmas – Feira Hippie, revitalização do Centro, BRT etc., coisas que parecem não se resolver nunca.

Edson Leite Júnior – As últimas eleições municipais mostraram a importância da escolha do vice. Quais seriam os critérios para sua escolha?

Que seja uma pessoa que tenha condições de assumir. Em 2020, meu vice foi Wilder Morais [hoje senador pelo PL, eleito em 2022]; em 2016, havia sido [o então deputado] Thiago Albernaz. Primeiramente, vice não pode ficar parado, tem de trabalhar. Hoje, meu primeiro suplente no Senado é Pedro Chaves [ex-deputado federal por vários mandatos]. É alguém que me ajuda o tempo todo, me representando onde precisa, entregando máquinas nas diversas regiões. É um trator para trabalhar. Não tem isso de ter um vice somente para composição política.

Elder Dias – No segundo turno de 2020, o sr. foi muito criticado, tachado até como desumano, por ter comentado a condição grave de seu então adversário nas eleições municipais, Maguito Vilela, internado em São Paulo com Covid-19. O sr. considera que errou naquele momento?

Primeiramente, é preciso saber o que eu falei realmente em relação ao que foi editado. Eu concedi uma entrevista à Rádio [Sagres] 730 AM, fizeram uma edição de uma fala e colocaram no horário eleitoral. Tanto é que a própria emissora entrou com uma ação contra a equipe de campanha de meu adversário, justamente por causa da edição.

Elder Dias – Mas o político experiente – e o sr. é um deles – sabe que suas falas estão sempre sob muito escrutínio.

Sim, mas uma coisa é a declaração em si e outra, uma fala editada. No caso, sempre tive o máximo de cuidado naquela eleição ao me dirigir a Maguito e à doença que ele sofria, porque, além de tudo, era um amigo, estivemos juntos em 2018 e em vários outros projetos. Em relação à posse dele, que eu considerei realizada de forma irregular, isso eu disse mesmo.

Elder Dias – Como estaria Goiânia hoje, se o prefeito fosse Maguito Vilela?

Bem melhor, com certeza. Maguito era um político experimentado, um administrador de verdade.

Elder Dias – A cidade estaria bem melhor do que estava no fim de 2020?

Maguito teria aperfeiçoado muito a cidade. Para ser um bom gestor público, não basta gerir os recursos próprios, tem de ter poder de buscar recursos extras, trazer bons projetos. Veja a questão do Anel Viário de Goiânia, algo que está sendo discutindo há décadas. A última vez que foi reunida toda a classe política para discutir esse tema fui eu quem promovi. O ministro [de Infraestrutura] era Tarcísio de Freitas e deixamos praticamente tudo encaminhado. Só que eu, como parlamentar, não posso pegar uma função que é do prefeito de Goiânia e do governador do Estado. Mais ainda do prefeito, já que é “Anel Viário de Goiânia” e, embora passe por vários municípios, beneficia mais a capital. Ora, quem tem de correr atrás e buscar força política é o prefeito de Goiânia (enfático). Eu fiz esse trabalho todo.

Elder Dias – E, se o prefeito fosse Maguito, o sr. considera que ele faria?

Claro, pelo conhecimento que tinha em Brasília. Veja quantos recursos ele conseguiu para Aparecida junto ao governo federal.

Euler de França Belém – Existe algum problema com as obras da Codevasf?

Pode ter certeza de que não há problema nenhum. O que pode ter é alguma empresa que entrou em licitação, subiu demais o custo e não quer entregar [a obra]. Então, isso, dessa forma, deve ser cancelado. Mas tudo regular, são empresas idôneas.

Euler de França Belém – A duplicação da BR-153 a partir de Anápolis vai sair?

Eu só creio isso depois de estar garantido no orçamento.

Euler de França Belém – E, no geral, como estão suas demandas em relação ao governo Lula?

Semanas atrás, o presidente Lula pediu para receber as demandas de um grupo de senadores do PSD e eu estava entre eles. Eu disse para meu líder, Otto Alencar (PSD-BA): “Eu não ajudei [na eleição], trabalhei na oposição a ele [Lula], o que eu vou fazer lá?”. Ele me respondeu “faça os pedidos, o presidente lhe conhece”. Enquanto outros senadores queriam bilhões e bilhões, decidi ali, então, fazer dois pedidos: um deles era a conclusão do Anel Viário de Goiânia; outro, a ampliação do Hospital Araújo Jorge [referência regional no tratamento de câncer], que não tem mais onde pôr gente. Falei a ele [Lula] que precisávamos crescer [o prédio] para cima e pedi para que me ajudasse na realização de três etapas, no total de R$ 260 milhões. A primeira, entre R$ 60 milhões e R$ 70 milhões. Ele então se virou para o ministro Padilha [Alexandre Padilha, das Relações Institucionais] e disse, na frente dos outros senadores, “olha, Padilha, o senador não pediu bilhões – isso rindo para os outros –, resolva isso para nós”. Então, posso dizer que a primeira etapa da ampliação do Araújo Jorge vai sair, falta agora aprovar os projetos complementares.