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Antigo chefe do Daap, Douglas Branquinho disse em mais de duas horas de depoimento que houve falhas na revisão técnica de alvarás emitidos entre 2007 e 2010 na capital

Douglas Branquinho durante depoimento à CEI das Pastinhas | Foto: Alberto Maia/Câmara de Goiânia
Douglas Branquinho durante depoimento à CEI das Pastinhas | Foto: Alberto Maia/Câmara de Goiânia

O ex-diretor do Departamento de Análise e Aprovação de Projetos (Daap) da extinta Secretaria Municipal de Planejamento e Habitação (Seplam) Douglas Branquinho confirmou ter assinado documentos fora do prazo legal entre 2009 e 2011 para a emissão de alvarás de construção de habitações residenciais coletivas e comerciais em Goiânia, em depoimento à CEI das Pastinhas nesta segunda-feira (17).

As supostas irregularidades foram relatadas pelo arquiteto e urbanista por mais de duas horas. Ele confirmou que o procedimento era normal naquele período, em que Iris Rezende (PMDB) e o atual prefeito, Paulo Garcia (PT), estavam à frente da prefeitura. O peemedebista é um dos convocados a prestar esclarecimentos na Câmara de Vereadores de Goiânia — o comparecimento não tem data marcada.

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“Houve documentos emitidos dentro do prazo e fora do prazo. Foi erro de revisão das datas e a prefeitura não deveria ter aceitado. [Devido à demanda] Era humanamente impossível revisar todos os processos que tentavam se adequar dentro da lei antiga [de 2007] e a nova [de 2010]. Ficamos em plantão até 22 horas em 22 de outubro daquele ano”, detalhou, citando o último dia de validade para complementar documentos nos processos.

As assinaturas permitiram a emissão de alvarás irregulares para empreiteiras pudessem construírem em regiões onde o Plano Diretor da épica não permitia adensamento urbano na capital. Até o momento, não há levantamento da quantidade de processos que teriam o visto dele. A CEI avaliou 30, sendo que todos contêm indícios de farsa.

Segundo o ex-diretor, o critério para autorizar a complementação de projetos após o tempo estipulado por lei (22 de outubro de 20110) foi decidido pela maioria do comitê técnico que discutia licenças sobre o uso de solo na cidade. “Foi um erro meu, de revisão técnica. Deveria ter anexado antes”, reconheceu, referindo-se à taxa de expediente de acréscimo anexada na juntada de documentos com data retroativa para empreendimento na quadra C8 da Rua 13 com a Avenida H, no Setor Jardim Goiás, de interesse da Prumus e outras duas construtoras. A prática é considerada ilegal, já que o pagamento do tributo é pré-requisito para protocole de processo.

Atualmente, ele está lotado no Departamento de Urbanismo e Desapropriação do Parque Urbano Macambira-Anicuns (Puama), em construção na Região Sudoeste de Goiânia.  O depoente não quis falar com a imprensa.

Assinando pelos outros

Segundo Branquinho, era comum que pessoas assinassem documentos no lugar das outras na secretaria, como no caso de Magali Teixeira Daher, ex-analista em Obras e Urbanismo da pasta. Em alvará de março de 2011 que requeria construção de habitação coletiva na Avenida Leblon com a Rua Caiçara no Setor Jardim Atlântico, por exemplo, ele assinou para subordinada. “Era permitido”, resumiu.

O ex-diretor também foi responsável por autorizar projetos arquitetônicos executados por servidores da prefeitura, como no caso da ex- diretora do Departamento de Aprovação de Projetos arquiteta Kellen Mendoça Santos. Ainda há suspeita sobre os nomes dos arquitetos Cesar Ricardo Nunes da Rocha (Departamento de Análise e Licenciamento), Celimene Faria Arantes (Estudos e Projetos) e Jonas Henrique Guimarães (Uso do Solo), citados no depoimento — a CEI aprovou a convocação deste último. Segundo denúncia, profissionais que coordenavam projetos em tramitação na secretaria eram privilegiados com aprovações mais céleres.

A suposta atuação também foi relatada pelo segundo depoente, Alberto Aureliano Bailoni, analista em Obras e Urbanização, que falou por pouco mais de meia hora à CEI. “São raríssimos os [servidores] que não fazem projetos para construtoras”, disse, sem apontar nomes. O funcionário está lotado na Seplam desde 1981 e explicou que sempre existiram requisitos básicos para que processos fosse protocolados regularmente na pasta.

Por isso, a comissão pretende propor à Justiça a quebra do sigilo bancário e fiscal dos proprietários das empresas que teriam prestado serviço de modo a beneficiar construtoras. Os vereadores querem ainda a lista dos processos aprovados entre 21 e 22 de outubro de 2010, últimos dias de prazo para se adequar a lei. Foram nestas datas os maiores picos de registro de protocolo de processos.

A janela de dois anos estava prevista para expirar em 19 de outubro de 2007 (mas foi adiado por dois anos), já que o novo regimento, mais rigoroso, não permitia adensamento vertical em regiões mais adensadas da capital, como na região do Setor Park Lozandes, ao redor do Paço Municipal, local que também teve obra com indício de irregularidades.

“Determinação”

Sem citar nomes, Branquinho disse que houve “determinação” para que toda a Seplam desconsiderasse o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado entre Ministério Público de Goiás e o Paço Municipal em outubro de 2010, relativo a construções de três empreendimentos na quadra C8 da Rua 13 com a Avenida H, no Setor Jardim Goiás, de interesse das construtoras Prumus, Opus e Consciente. Com isso, foram adicionados 27 metros quadrados a mais no terreno.

A decisão, conforme relatou, veio a partir de reunião entre o superior dele, Jeová Alcântara Lopes, do corpo jurídico da Seplam e do comitê responsável pelo uso de solo. “Eu orientei [os analistas], mas era uma decisão da secretaria. Não me lembro com quem discuti isso”, disse, ao ser questionado se o advogado e ex-procurador geral do Município Marcone Pimenteira estaria envolvido.

Fora da lista

Branquinho ainda falou que empreendimentos não listados em anexo da lei complementar 204, de 4 de maio de 2010 — criado por Iris Rezende e prorrogado pelo atual prefeito, Paulo Garcia (PT) –, tiveram alvarás concedidos irregularmente pela Seplam. “Eu não sei de quem foi a ideia de criar, dar as diretrizes para a elaboração final da redação do decreto”, argumentou.

A lista, aprovada previamente pela Câmara de Vereadores na época, resguardava a apenas 131 empreendimentos o poder anexar documentos ausentes nas pastas protocolados na secretaria.

O ex-diretor afirmou que a brecha concedida àquelas empresas fora da lista se justificariam pelo fato delas não terem documentos necessários dentro do prazo. “Eles podiam estar com projetos em andamento. Em alguns casos foram anexados depois, com a licença de uso de solo.”

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